17 de jan. de 1984

Madrugada em Foco

Às vezes a noite nos dá uísque
Às vezes ela nos dá agua
Às vezes ela nos dá os dois

Essa mesma noite que figura pela vida
Ao longo de uma grande avenida
Que nos ilumina com seus postes esparsos

De em quando há vez

Em que nos ilumina
Palavras de lamparina
Sempre acesas
Vagalume
Voando folhas num tufão

A certeza de pegar
Num espaço vítreo
Tanto quanto
Há do infinito
Picos que não fugirão de ti

16 de jan. de 1984

De ponta cabeça

O que fazer quando nada te satisfaz?

Quando as escolhas que você julgou certas

Não poderiam estar mais erradas


Quando você pensava ser autruista o suficiente

Pra se contentar com a felicidade do outro

Ainda que longe de você


E se estava tudo errado?

E se você também não fez nada muito certo

E se a gente não faz sentido junto?

Não é isso que nos apetece?


Ultimamente você havia estado certa tantas vezes

Que acabei achando estar certa dessa também

Mas acho que pra variar

Quem estava certo era eu

15 de jan. de 1984

Linhas da Vida

Sentado aqui no topo de todo esse verde
Apenas com o pôr do sol colorindode laranja o dia cinza que fica para trás

Paro e penso que nesses últimos tempos cruzei meus caminhos com os de muitos
Muitas almas, muitas pessoas, muitos insanos
Conheci algumas pessoas incríveis
Outras nem tanto

Paro e penso que vi surgir os maiores gênios da minha geração
Vivi seus maiores surtos de lucidez
E os vi serem derrubados por sua própria genialidade

Paro e penso que nessa encruzilhadas que se formam, esbarrões aconteceram
Não sei se causei impacto na vida de alguma dessas pessoas, talvez sim
Tenho certeza, porém, que tenho profundas cicatrizes, marcas
Do impacto que essas pessoas causaram em mim

As coisas nem sempre são tão belas ou tão perfeitas como gostaríamos
Mas cabe a nós fazer delas as melhores possíveis

Assim como escrevemos nossas histórias, moldamos nossas experiências ao nosso gosto
E assim construímos nosso rastro, muitas vezes que só nós podemos ver
Mas é nosso

Finalmente,
Paro e penso como será o futuro e quase me preocupo, mas não o faço
Lembro de algumas sábias palavras, que um insano uma vez me disse
"Cada um escreve sua lenda pessoal"

Ah, e como eu odeio ver que elas me confortam de tal forma nesse momento
Fazer o que, essas coisas são engraçadas

14 de jan. de 1984

Raspas de Limão

Fujo e sento pra pensar um pouco na vida
Ao calor, assisto um carteiro descarregar as encomendas
Deisleixado e sem consideração, ele joga elas como caixas vazias
Sinto como se meu coração estivesse numa delas

Saio dali pra me fazer bem, vou procurar algo pra adoçar o amargo da minha boca
Um chocolate, uma torta, um Muffin talvez
Burro, escolho limão, nem de longe o doce que procuro

Volto cabisbaixo da tentativa de alívio, com um peso maior que meus ombros aguentam
Pelo dia cinza, piso nas poças sem cuidado
Molho meus sapatos e minha calça

Me ofereço aos quatro ventos, buscando alguém com quem dividir a sarjeta

Mas é em vão

Qualquer coma alcólico seria melhor que essa ressaca emocional
Mas até isso está longe demais pra mim

Até poderia me esforçar pra escrever melhor e aliviar isso
Mas nem isso tenho vontade de fazer

Está tudo sem valor

Pensar que quase tudo isso fruto de um amor de irmão
Tenho nojo da minha vida, tenho pena de mim

13 de jan. de 1984

Semissônico

Meu coração nem é tão grande assim,
Nem guloso
Apenas afobado

Não me deixe parecer malandro,
Pois de bamba só tenho o berço
E por isso já basta

Que sem querer me dar bem já me dou mal
Imagine o contrário
Não aguentaria,
Seria muita dor

Mas ainda qu'essa que não cessa
Que vai e vem
Noite sim, noite não
Levando pouco a pouco pedacinhos do meu coração

12 de jan. de 1984

Chuva de euforia

Mulheres, mulheres

Que decepções mais trarão-me


Não quero teu corpos,

Quero tuas almas

Pra completar a minha


Não quero teus olhos,

Mas teus olhares

Pra me fazer tremer


Não quero tuas bocas, nem teus beijos,

Quero teus sorrisos

Pra espantar esse choro da minha casa


Por fim


Quero vocês por inteiro,

Por tudo que são,

Não pelo que veem ser

11 de jan. de 1984

Meio escura carta ao amor que não se vê - Manifesto à meia luz

Amor,


Eu tô de saco cheio de ficadas sem gosto

De garotas sem cor

Quero um tempero novo

Cheiro, sabor


Quero alguém pra me prender

Me segurar sem me soltar

Alguém pra quem eu possa

Deixar me abraçar


Um cantinho, um violão

Um acorde maior, feliz

Deixar pra trás essa terça menor

Dessa pintura de carvão e giz


Pra aquarela, flor amarela

Campos clarear

Num sono leve, doce

Me jogar e me afogar


E nessa pedaço de guardanapo eu me despeço

Meu espaço não faz jus

Encerro aqui

Meu manifesto à meia luz

10 de jan. de 1984

Café prozaquiano

Sento na crista da Alvorada
Acima do infinito, apenas
Paro, penso, prosto
Jogado na sarjeta de atos escrotos

Retrocedo com meus dedos sujos
O relógio da minha testa
Pra voltar, rever, repensar
Me torturo com a indulgência vendida a uma alma sem luz

Besteira!
Pura hipocrisia de mim mesmo
Tão tolo quanto esconder sua cara na frente do espelho

Sento na Crista da alvorada
Espumeiro da uma onda inconsequente
Espumante de lábios inexperientes

Sinceramente?

Pareciam inscrições tão certas
Nos anais de minha moral
Mas joguei as tabuletas pela janela
Como quem bate um cigarro para se livrar das cinzas do outrora carbonizado

Minha ressaca é dura comigo
Vou até a cozinha fazer um café
Ligo o rádio, bem alto
A fim de abafar as vozes na minha cabeça

Ouço
Previsão de uma noite clara como dia
Iluminada por duas estrelas, apenas

Previsão nunca é certa

Mas vamos como Loki vai se sair
Hoje a noite no Ragnarok

9 de jan. de 1984

Amor de poeta

Ah, maldita Poeta
Que habita meus sonhos e memórias

Mulher de doces lábios
Que como vinho, melhoram ao invés de envelhecer

Olhos marcantes
Sorriso único
E o toque
Ah, o toque como só ela sabe tocar

Puxa, sereia sem cauda
Que a risada em canto encanta quem não tomar cuidado

Feiticiera da noite inalcansável
Que esquiva e esgrima com sagacidade inigualável

Ser misteriosa
Algoz
De eu-Fenrir

Trancafiado
E aguardando
Até o fim, desse momento

Quando o confronto!
A deflagração!
A Última Batalha!
...ou não

Que digam as Nornas

8 de jan. de 1984

Do fim ao renascer sem deixar de ser

Não quero ser gente
Quero ser coisa

Desforme aos olhos de quem vê
De forma definida aos corações de quem sente

Quero ser quem sou, sem ser quem querem que ‘seja
Que vão pro diabo que te carreguem com suas filosofias

Visões empedradas em velhas lápides do bon senso
Selando a vida da liberdade, da alegria de viver

Não quero suas regras
Feitas pra limitar a visão

Quero um verde campo de infinitas léguas
Pra enxergar com o coração

Olhos são pros fracos
Que não conseguem imaginar

Que não se permitem alçar vôos mais altos
Que a altura de um passo

Quem se contenta com isso faz uma escolha
Escolha é escolha e só diz ‘ao escolhedor

Que seja o que for
Pra ser, sentir ou deixar passar

Horas e horas e horas
Mas sento sem ver o tempo passar

Figuras repetidas jogadas ao deus dará
Mas quem é você pra dizer se certo ou errado está?

7 de jan. de 1984

O acerto irregular

Os poeres não chegavam
Os luares não passavam
O tempo se arrastava
Como nunca havia antes

Antes ufânicas, vagas idéias
Agora vagueiram por essas terras
Anjos caídos de alturas
Pousando como plumas

Você apareceu
Vida entardeceu
Verdadeà vida veio
Brotando do fundo do seio

Os poeres chegam logo
Os luares, no céu fogos
Aos céus peço aogra
Que não te levem em má hora

E má hora que não veia
Boa hora pereneia
Conforto que me bate
Do sermão do Abade
Divindade, sacra pureza
Descanso o sonho em sua beleza

6 de jan. de 1984

Meu coração

Às vezes pego a caneta e o papel pra me forçar a escrever, como se me sentisse na obrigação de imprimir meu coração no papel.

Àsvezes meu coração me manda pegar a caneta e o papel e rege minhas mãos, vai ver deu vontade nele, vai ver não tinha mais nada pra fazer.

Ele é meio doido, não sabe o que quer. Tem horas que gosta de fazer tudo bonitinho, nos conformes, mas tem horas que ele sai jogando tudo à esmo, como ficar, ficou.

Às vezes ele quer falar de amor
Às vezes quer dizer que tá triste
Certas horas quer falar de Rock n' Roll
E outras horas diz coisas que nunca disse

Meu coração é assim, nem se dê ao trabalho de tentar entender. É mais fácil deixá-lo lá, pra ele ser o que quiser ser

5 de jan. de 1984

Saudosismos desmedidos de minha vida

Tenho saudades de minha vida
Ah, se pudesse voltar a vivê-la
Como gostaria de ter de volta aquelas tardes
Tardes sem fim de aventuras no velho oeste

Tenho saudades de minha ivda
Ah, se pudesse curtí-la novamente
Como eram boas aquelas histórias que ouvia
Singelas aventuras fantásticas e inesquecíveis

Tenho saudades de minha vida
Ah, se tivesse outra oportunidade
Gostaria de novamente dar aquelas gargalhadas
Simplesmente viver, sem me preocupar com nada

Mas a vida já se foi
E não vai voltar jamais
Eu agora renasci
Como um reles capataz

4 de jan. de 1984

Não tenho coragem de pular no fogo

As vezes queria ter coragem pra ser louco como eles
Viver a vida à toda
Vivenciar tantas experiencias pra não caber mais
Loucuras, devaneios
Viver uma vida sem freios
Sair por aí
Sem rumo 
Sem caminho
Amar o momento até o ultimo fio
De sua vida

3 de jan. de 1984

Eu sou mais eu

As pessoas riem de mim
Dizem que eu sou um sonhador
Que vivo no mundo da lua
Que não tenho futuro algum

Me perguntam por que eu sou assim
Por que eu gosto de ser diferente
Por que meus ouvidos ouvem assim
E minha boca fala assado

Elas ficam em volta de mim, apontando
Comentando cada detalhe
E fazendo caras como se eles fossem ruins

E vocês que não sabem amar?
Que não sabem abrir o coração
E deixar sair o que está dentro de vocês?

2 de jan. de 1984

Relatos do trajeto

Minha boca tem feridas
De um caminho tortuoso
Em busca de uma vida de gozo

Minha boca tem feridas
De golpes que levei
São marcas de tudo pelo que passei

Minha boca tem feridas
Da mordida do anseio
Por anseiar pelo fim
E não aproveitar o meio

1 de jan. de 1984

A partir de agora

Precisava botá-los pra fora
Deixá-los respirar ar fresco
E serem banhados pela luz

Libertos das páginas agora
Das pautas, como um cerco
Ao meu coração farão jus

Voam livres nessa hora
Livres daquele aperto
Se libertam da cruz